Zeros - Coleção Petit Poa
Zeros - Coleção Petit Poa
Zeros - Coleção Petit Poa
Zeros surgiu num momento muito especial.
Depois de um período bastante fértil na Capital Paulista - e de já contar nove anos fora do RS, passando por Florianópolis, Alto Paraíso de Goiás, Curitiba e Belo Horizonte - bateu uma vontade enorme de retornar a Porto Alegre.
A cena da poesia estava borbulhante no final dos anos 80 e início dos anos 90. Acabara de conhecer os poetas Ricardo Silvestrin, Ricardo Portugal, João Angelo Salvadori, Celso Gutfreind e Mario Pirata. Contribuíra para que José Neto da Livraria Arcano 17 realizasse bochincho literário “O Tempo e o Evento” - título dado por Leminski à efeméride do inverno de 1987, com a presença de Alice Ruiz, Rettamoso e o próprio Paulo.
Ao retornar definitivamente para Porto Alegre, entrei de cabeça em três projetos, que se revelaram da maior relevância: A Roda da Poesia, a banda Os Três Poetas e a Coleção Petit Poa.
Meu segundo livro, Zeros, surgiu neste contexto. Reunindo poemas produzidos entre 1986 e 1990. Zeros é um livro onde, de certa forma, pude apresentar três matrizes que me acompanham desde muito: o verso livre breve, o poema visual e o haicai.
Zeros integrou a saudosa e célebre Coleção Petit Poa, edição realizada pela Secretaria Municipal da Cultura, da qual fui editor, e que publicou mais de trinta poetas de matrizes diversas e gerações várias. Encontra-se esgotado desde 1996.
alguns poemas:
faço versos
sim, faço versos.
sou réu confesso
faço versos
quando tropeço
no universo
faço versos de bobo
e não há acerto
que me faça
não errar de novo
faço versos
porque posso
se não faço
me dá um troço
faço versos
por nada
por pirraça
é a minha cachaça
faço versos
porque quero
se nesse mundo
tudo tem um número
o meu é zero
sempre corri atrás de mim
como uma criança atrás de um balão
levado pelo vento
eu era o vento e não sabia
nunca mais digo nunca
nunca é muito tempo
e sempre também
vou dar um tempo
vou dar tempo ao tempo
o tempo engole tempo
engole tudo
os bons e os maus tempo
num gole o temporal
vou dar um tempo
até o singular
virar plural
o guarujá passa
alguma coisa acontece
minha pressa vira prece
e o guaíba deságua na calçada
se o guarujá passa
me vem à cabeça
a balada do pintor
que pintava de mãos amarradas
a imagem daquele louco
que dizia o verdadeiro quadro
nunca estar pronto
esse é o ponto
a poesia me sabe
quem sabe eu sei?
amor é droga pesada
não é melhor em pasárgada
mas se o guarujá passa
antes fosse amigo do rei
a vida é já
tudo passa
passa o guarujá
*
paciência de tartaruga
cem anos
em cada ruga
panela velha
no avarandado novo
vaso de avencas
voo de borboleta
do mundo das coisas
pro mundo das letras
livro antigo
o bicho traça
o sonho do sábio
meia-noite
nem amanhã
nem ontem
*
sexta-feira, 9 de março de 2012